'Os partidos estão cada vez mais perdendo força'

Nova presidente do TRE, que toma posse hoje, defende uso da internet como ferramenta para atrair jovens para a política
Qual é a concepção de Justiça Eleitoral para a senhora?
A Justiça Eleitoral é uma das coisas mais importantes que nós temos, porque ela é uma Justiça totalmente popular. É uma Justiça que, quando vai funcionar, funciona com a participação da população. Os mesários e os presidentes de mesa são cidadãos, eleitores que ajudam os demais eleitores a exercerem um direito importantíssimo para a democracia. 
Qual é a sua avaliação da Lei da Ficha Limpa?
A Lei da Ficha da Limpa é uma beleza de lei. É a primeira vez em que temos uma lei com essa repercussão e que nasceu da vontade popular. Ela demonstra que a nossa população já está amadurecida. E muito disso devemos ao Código de Defesa do Consumidor, que mostrou que você podia brigar por seus direitos. Daí o cidadão foi descobrindo que ele não tinha só o direito de reclamar do liquidificador que queimou. Tudo isso foi um movimento que culminou na Lei da Ficha Limpa. O eleitor mostrou que também queria ver garantidos os seus direitos de cidadão-eleitor. Com isso, ele deixou de pensar só no seu direito individual, no liquidificador que queimou, e passou a pensar coletivamente. Isso é fantástico.
Mas ainda há divergências com relação à interpretação da lei. Como vê essa questão?
A Lei da Ficha Limpa ainda é muito moderna. Ela foi promulgada em 2010, e só a aplicamos na eleição de 2012. Ela está em franco desenvolvimento e franca aplicação. As decisões dos tribunais regionais agora é que começam a chegar ao Tribunal Superior Eleitoral. Acho que, a partir de 2014, começaremos a ter uma compreensão mais clara de alguns itens que ainda geram discussão e que dependem da posição do Tribunal Superior Eleitoral.
A senhora é estudiosa da relação entre as novas tecnologias de comunicação e o direito. Como a internet pode ajudar a nossa democracia?
Num dos seus livros, Fernando Henrique Cardoso comenta exatamente isso. A internet com certeza vai influenciar muito. E ele faz um parâmetro bastante interessante. O que ele diz é que os partidos políticos tinham muita força, porque precisávamos fazer um grupo, precisávamos estar reunidos. Então, nós tínhamos grupo de tudo. O partido político era isso, uma agremiação de ideias e de amigos. Com a internet, não há mais necessidade de você sair de casa para procurar o seu grupo. O seu grupo é o seu mundo dentro da sua sala, do seu quarto, na sua casa. Evidentemente, essa modificação de busca de grupos vai influenciar. De que maneira? Não sabemos. Realmente começamos a ver que ninguém mais vai para partido político. Os partidos estão cada vez mais perdendo força.
Esse é um problema que afeta a participação dos jovens na política, não?
O jovem não vai para partido político porque ele não precisa daquilo. Por quê? Porque ele precisa se conectar, e ele está conectado com o mundo através da internet. Agora, como vai se operar essa mudança (o uso da internet nos processos eleitorais), ainda é incipiente. Tivemos recentemente decisões com placar apertado no TSE, onde se discutiu justamente se a internet poderia ser usada como veículo de propaganda, como veículo de comunicação política. Eu acho que terá que ser. Isso vai acabar acontecendo.
A senhora é favorável a um maior uso da internet nos processos eleitorais?
Que isso vai evoluir e que vamos precisar de novos mecanismos, sem dúvida. Esse é para mim o grande desafio. A internet é muito recente. As redes sociais são mais recentes. Estamos aprendendo a lidar com as redes. A grande maioria dos julgadores, principalmente nas cortes superiores, reage às redes sociais e à internet, mas essa mentalidade vai acabar evoluindo. E essa evolução vai ser muito bonita de acompanhar. Não vejo outra saída. Não sei se daqui a cinco anos teremos outro instrumento de comunicação, mas o que temos hoje é isso. É o Twitter, o Facebook e o Instagram. É o que todo mundo está usando. Você só tem uma maneira de mobilizar o jovem, e esse pode ser o caminho.
Mas ainda convivemos no Rio com inúmeros crimes eleitorais que afetam a participação do cidadão.
A compra de votos existe em quase todos os locais. Às vezes, não é uma compra em que se entrega dinheiro, mas se entrega um benefício. Isso a gente tem, talvez até pela cultura da população, em que todo mundo quer buscar o apoio do Estado para alguma coisa. O Estado babá existe até hoje. Essa busca do Estado babá acaba levando a essa troca, porque a nossa população é pobre, necessitada, e acaba recorrendo aos centros sociais espalhados por vários lugares.
Como o TRE pode ajudar a evitar esses crimes eleitorais?
Vou criar uma unidade de segurança e inteligência. Esse departamento vai mapear o Estado do Rio e identificar os locais onde há prática de alguma irregularidade. Depois, vamos chamar os partidos aqui para que eles tomem providências antes de o processo eleitoral começar.
Por Fábio Vasconcellos
Fonte: O Globo - 01/02/2013

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