Opinião - Meu nome é “Ma”, lamento o final melancólico do PT


A política não tolera atrasos. As coisas andam com rapidez e agora estou curioso para ver como o senador Jorge Viana (PT-AC) vai enfrentar uma pressão inédita em sua vida política. Mas minha expectativa precisa relembrar o que houve nos últimos dias. Creio que todo mundo teve notícia do golpe que se armou no Congresso Nacional, mas para alguém que tenha se atrasado, como eu, vale repetir.

O Congresso parou tudo –varejo e atacado- para votar em “urgência urgentíssima” uma lei contra Marina Silva. Seu novo partido, a Rede Sustentabilidade, pode ficar sem acesso à verba de manutenção e quase sem tempo de propaganda em rádio e TV. Nas eleições de 2010, com o pequeno Partido Verde, Marina tinha um minuto e 23 segundos. Pela nova lei, seu tempo seria de 35 segundos e os deputados ainda acham muito: incluíram uma emenda que diminui para cerca de 11 segundos. É menos do que teve Enéas Carneiro que, com 15 segundos, ao menos podia dizer seu nome.

Embora menos prejudicados, outros partidos que querem lançar candidatos a Presidente (Aécio Neves e Eduardo Campos), são contra a nova lei, pois se a candidatura de Marina for inviabilizada é possível que o PT reeleja Dilma Roussef no primeiro turno. É por isso que os operadores do governo tiraram da cama os deputados para irem à noite votar o regime de urgência.



Foi vergonhoso o comportamento dos deputados governistas do Acre. A deputada Perpétua Almeida escapou na última hora, ausentando-se na sessão que aprovou o projeto, certamente aconselhada por seus camaradas do Acre, especialmente os deputados estaduais Eduardo Farias e Moisés Diniz, que haviam elogiado Marina e prometido, publicamente, ajudar a Rede na coleta de assinaturas. Já o petista Sibá Machado destacou-se na sessão, com salamaleques e demonstrações explícitas de puxa-saquismo para dar aos seus chefes a certeza de que não foi contaminado pelas idéias sustentabilistas nos quatro anos em que substituiu Marina na condição de senador-suplente.

A ordem da cúpula nacional para “garfar” Marina pegou o PT do Acre no contrapé. O governador Tião Viana (PT) assinou a lista da Rede, junto com o ex-prefeito Raimundo Angelim. O prefeito Marcos Alexandre já se preparava para fazer o mesmo. Os políticos do Acre, de diversos partidos, incluindo os que fazem parte da coligação liderada pelo PT, declaravam respeito pela conterrânea Marina Silva e saudavam seu partido como uma força renovadora na política brasileira. Não podia ser de outro modo. Afinal, há poucos meses, no segundo turno das eleições municipais, todos pediam o apoio de Marina para seu candidato.

Ressalte-se que o PT do Acre vive uma situação diferente, pois enfrenta a oposição do PMDB, ao contrário do comensalismo que acontece em âmbito nacional. É também visível que a intimidade dos irmãos Viana com Dilma e seu governo não é nem sombra daquela que tinham com Lula. Talvez isso lhes dê uma perspectiva diferente e uma pequena margem de autonomia.

Há dois dias, Jorge Viana fez pronunciamento em que disse discordar da tentativa de prejudicar Marina e a Rede “mudando as regras no meio do jogo”. Anunciou que vai tentar mudar o projeto aprovado na Câmara, propondo que só entre em vigor depois das eleições de 2014. Jorge ainda tentou salvar a pele do governo, dizendo que Dilma e Lula não são os autores da manobra feita pelos deputados.

Digo que tentou salvar a pele do governo porque o resultado pode ser o contrário do esperado. Há indícios de que a coleta de assinaturas para registro da Rede ficou mais fácil e mais rápida, em todo o Brasil, com o sentimento de solidariedade contra o golpe. A nova lei pode ser contestada e derrubada na Justiça. E mesmo que se mantenha, Marina pode continuar bem situada nas pesquisas a ponto de ganhar espaço no noticiário e ser convidada para os debates. Com uma boa campanha na internet e nas ruas… Olha o partido do Beppe Grilo na Itália como exemplo do que pode acontecer.

Mas veja como são as coisas: um dia depois do discurso do Jorge Viana, saiu outra do seu correligionário Sibá Machado no jornal O Rio Branco. O senador acende uma vela no plano nacional e o deputado assopra na província. Diz que não vai assinar a lista de Marina e discorda dos companheiros que estão assinando. Que é do PT e não vai dar facilidades para a formação de outro partido. Trata o assunto no bico da chuteira.

A princípio, pensei que era um posicionamento para a política local. Sibá não tem chance de ser candidato a um cargo majoritário (senador, prefeito ou governador) nos próximos dez anos. Nem se importa com segundos turnos ou com alianças, quer garantir a faixa do eleitorado que pode renovar o mandato de deputado federal dele. Não é por acaso que, na mesma entrevista, diz que o mensalão nunca existiu e que era apenas uma trama da oposição para derrubar o Lula. Tá na dele, procura agradar aos que lhe acompanham à mesa.

Mas ontem percebi que o buraco é mais em cima. Soube de uma reunião no Senado, sem a presença de Jorge Viana, em que o PT fechou questão para aprovar a lei anti-Marina do jeito que saiu da Câmara e com a mesma urgência. O “núcleo duro” mandou recado. Manda quem pode, obedece quem tem juízo, não é assim que se diz? Parece que a valentia do Sibá, afinal, é dublagem de um rugido mais forte.

E agora, quem se atreve a manter alguma independência e votar de acordo com seus princípios? Suplicy tem condições pra isso. Jorge Viana terá? Por motivos estritamente pessoais, sem nenhuma ilusão política, apenas por gostar gratuitamente dele, torço para que Jorge mantenha sua posição. Nem penso, como ele deve pensar, no que lhe trará mais prejuízo, a autonomia ou o recuo. Simplesmente espero que ele fique firme.

Sinceramente, lamento o final melancólico do PT. Um dia desses revi um livro maravilhoso, “Cartografias do Desejo”, organizado por Sueli Rolnik, com as palestras e entrevistas do psicanalista francês Felix Guattari em sua visita ao Brasil no distante ano de 1982. O Partido dos Trabalhadores estava surgindo, Lula tinha sido candidato ao governo de São Paulo e os movimentos sociais alargavam seus horizontes na reconquista da democracia. Sonhávamos, naquele tempo. Éramos utópicos e idealistas. Recomendo que todos leiam, para lembrar.

São poucos os que ainda mantém seus sonhos, ideais, utopias e princípios. Como dizia Leminsky, é fácil ser poeta aos vinte, difícil é permanecer poeta aos cinqüenta. Mas alguns conseguem. É por isso que meu nome é Marina, mesmo que tenha –por falta de tempo- que dizer apenas a primeira sílaba, como tenho aprendido com os mineiros.

Por Antonio Alves é jornalista, fundador do PT, ex-secretário estadual de cultura do Acre, ex-petista e articulador da Rede Sustentabilidade

Fonte: Terra - Blog da Amazônia - 26/04/2013

Comentários