Lei aprovada em comissão da Câmara pune empresas de forma mais
contundente
Mais de dez anos após se comprometer a
responsabilizar empresas por práticas como o pagamento de suborno em troca de
vantagens, o Brasil finalmente começa a dar sinais de que terá uma lei
anticorrupção. Em abril deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto
que pune de forma mais efetiva as companhias responsáveis por práticas ilícitas
dentro e fora do país. O projeto aguarda um parecer da Comissão de Constituição
e Justiça antes de seguir ao Senado Federal.
A nova lei determina que as empresas devolvam aos cofres públicos os prejuízos
causados por atos ilícitos, além de estipular a aplicação de multas. A empresa
ainda ficará sujeita à perda de bens e à suspensão ou interdição parcial das
suas atividades. Nos casos mais graves, a empresa poderá ser fechada. Esta
regra vale para as companhias conhecidas como fantasmas ou laranja, aquelas
criadas com o intuito exclusivo de facilitar a prática de atos ilícitos ou
ocultar beneficiários.
Hamilton Fernando Cota Cruz, assessor especial da Controladoria Geral da União
(CGU), órgão responsável por monitorar a transparência do governo federal,
prevê mudanças no comportamento do setor privado. “Com a lei, o empresariado
vai ter de começar a se preparar e adotar mecanismos de controle interno para
evitar o pagamento de propina.”
Empresários e deputados resistiram ao projeto
O projeto demorou três anos para ser votado desde que foi enviado pelo
Executivo, em fevereiro de 2010. Durante mais de um ano, aguardou a criação de
uma comissão para discutir o tema, que só começou a trabalhar em maio de 2011.
Depois, a proposta sofreu forte oposição de empresários e de deputados dentro
da comissão, liderados por Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Entre as principais mudanças feitas no projeto do Executivo, está a diminuição
do valor das multas que podem ser aplicadas às empresas. A proposta original
previa multas de 1% a 30% do faturamento bruto anual. Caso isso não seja
possível, o valor iria de 6 mil reais a 6 milhões de reais. A proposta do
relator do projeto na Câmara, Carlos Zarattini (PT-SP), determina multas de
0,1% a 20% do faturamento bruto anual, com os mesmos limites.
Zarattini também transferiu para o Judiciário a possibilidade de cassar o
direito das empresas de obter financiamentos, um das mais graves formas de punição.
Antes, os órgãos de controle poderiam tomar medidas administrativas contra os
corruptores. Agora, as punições correm o risco de ficar paradas, se arrastando
nos corredores já superlotados da Justiça.
Cota Cruz, da CGU, diz que as modificações não comprometeram o projeto. “Não é
o texto que a gente mandou, mas estamos satisfeitos. Do jeito que está, vai ser
um mecanismo muito importante do combate ao suborno.” Zarattini, relator do
projeto na Câmara, acredita que as concessões feitas foram suficientes e que
agora o projeto está “amarrado” com os setores que eram resistentes a ele. “Da
forma como ele foi aprovado [na comissão especial da] Câmara, acredito que não
terá grande resistência no Senado”, diz o deputado.
Brasil está atrasado na elaboração da lei
A aprovação do projeto pode encerrar um longo período de negligência do poder
público brasileiro com empresas corruptas. O Brasil se comprometeu a ter uma
lei que punisse o suborno cometido por empresas fora do país em 1997, quando
assinou uma convenção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE). O acordo foi ratificado por um decreto presidencial no ano
2000, mas o governo brasileiro só apresentou um projeto uma década depois, em
2010. Em todo este período, o poder público continuou brando na punição a
empresas corruptoras. A principal pena prevista atualmente é a proibição de
manter contratos com o Poder Público, mas não há qualquer responsabilização
criminal nem administrativa.
A lei, sozinha, não vai servir para mudar a cultura de corrupção e impunidade
no país. “É necessário ter a execução da lei. Você tem lugares no mundo em que
há leis, mas estão em situações piores que o Brasil”, diz David Stulb, diretor
internacional dos serviços de investigação de fraudes e disputas da Ernst &
Young e membro da ONG Transparency International. “As palavras no papel não
valem nada sem o esforço do governo”, afirma.
Os resultados do Brasil serão avaliados pela OCDE. Em fevereiro do ano que vem,
uma delegação da entidade deve fazer uma visita ao país para avaliar as medidas
tomadas. Uma análise dos relatórios sobre o Brasil será realizada em junho de
2014 na reunião do grupo de trabalho sobre suborno da organização. A CGU espera
que o projeto seja aprovado antes do próximo contato com a OCDE. Em entrevista
à CartaCapital, o ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, diz que o Brasil tem
passado “situações desagradáveis” por não possuir uma lei. “O Brasil vai ficar
numa situação muito constrangedora agora em novembro, que é o prazo da nova
avaliação pela OCDE. Estamos há quilômetros de atraso.” Agora, cabe ao Senado
decidir quanto tempo o Brasil continuará constrangido.
Por Piero
Locatelli Com informações da Agência Câmara
Fonte: Carta Capital - 04/05/2013
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